Ângela Dias
Geometrias
10 de setembro – 1 de outubro 2017
Livraria Sá da Costa, Rua Garrett, 100-102, 1º andar, Chiado
Geometrias,
ou impressões digitais dos deuses
O tema da ruína tem sido recorrentemente tratado por artistas ao longo dos tempos, com particular insistência desde o Romantismo – abordado, muitas vezes, numa perspectiva ontológica, reflectindo sobre a fragilidade intrínseca do destino do homem neste mundo, reinterpretando, outras vezes, os vestígios sobreviventes de uma memória histórica elidida para todo o sempre no fio irrecuperável do tempo sucessivo e, mais recentemente, com o advento do modernismo, como reflexão ética sobre a praxis social ou, pura e simplesmente, enquanto jogo de desconstrução e reconstrução de novas harmonias e equilíbrios formais.
Relativamente à exposição de Ângela Dias, patente agora na galeria da Livraria Sá da Costa, intitulada Geometrias, o tema da ruína reaparece, como leitmotiv, em quase todos os trabalhos expostos, conjugando uma reflexão sobre o espaço habitado – quando articula a dicotomia entre interior e exterior – com a dimensão mais colorista, emocional e espontânea que a prática da aguarela reclama.
É uma exposição composta por desenhos e objectos. Desenhos feitos a lápis de carvão com aguarela e acrílico diluído. Objectos de esferovite desconstruídos e reconstruídos com cortes, montagens e aplicações de camadas de gesso ou massa. Objectos que se relacionam com os desenhos e vice-versa. Imagens desenhadas, fragmentos alusivos à casa, à ruína, à arquitectura e ao corpo, num diálogo figurativo e abstracto que, por ouro lado, nos transmite, no imediatismo do gesto e da cor translúcida que o acompanha, sensações à flor da pele, contradizendo o racionalismo formal que o título da exposição sugere. A ambivalência que definem entre o espaço habitado por um corpo que, afinal, ele mesmo, cativo e intranquilo, o redefine e altera, sujeitando-o à volúvel qualidade das sensações, confere a estes desenhos, a cada um deles, o estatuto de brevíssimas “impressões digitais dos deuses” – citando o poeta Joaquim Castro Caldas. Nem poderia ser de outro modo pois, como afirmou Paul Signac “uma aguarela deve ser um amontoado de flores e a rapidez de execução, a exiguidade do formato, permite-lhe também livrar-se dos detalhes que poderiam confundir a sensação”.
José Sousa Machado
Maio 2017
